A Cruz e o Bisturi

Gwen Wilkerson tinha meu respeito antes mesmo de eu a conhecer. Eu fiquei surpreso quando Dave me disse que, enquanto ele estava na Arena São Nicolau, querendo ganhar vidas para Cristo, a sua esposa estava pronta para dar à luz a qualquer momento do seu primeiro filho, Gary. Eu era um dos membros da gangue na arena naquela noite. Eu sei que toda esposa quer que seu marido esteja com ela quando ela dá à luz, e Gwen dar a sua bênção para Dave ir a Nova York foi um dos atos mais emocionantes de bondade de que eu já ouvi falar. Sou grato até hoje pelo apoio que Gwen deu o Dave e pelo sacrifício pessoal que ela fez ao permitir que ele a deixasse passar pelo parto sozinha, pois ele obedeceu ao Senhor e iniciou o lindo trabalho que conta no livro A Cruz e o Punhal.

Pouco depois da minha conversão, Dave decidiu levar a mim e a Israel Narvaez, outro líder de gangue salvo na Arena São Nicolau, para à sua casa na Pensilvânia. Como garotos da cidade, nunca tínhamos estado onde havia mais vacas do que pessoas e, embora tivéssemos corações novinhos em folha, carregávamos a rua em nosso jeito de caminhar, na forma como falávamos e no modo como nos vestíamos. Me pergunto se Gwen sabia que tipo de “convertidos” Dave estava levando para casa. Eu tinha certeza de que ela nunca tinha tido alguém como nós em sua sala antes.

Quando Israel e eu entramos no pequeno aconchego dos Wilkerson e vimos Gwen caminhando até nós para nos cumprimentar, observamos cuidadosamente todas as nuances da sua resposta, imaginando se ela demostraria medo, desconfiança ou aversão. Mas desde o primeiro momento em que conheci Gwen senti como se estivesse sendo tocado pela ternura e pela bondade. Sem me conhecer, ela me abraçou com força e agradeceu a Deus por minha salvação, seus olhos estavam brilhantes e repletos de amor. Mesmo sendo muito jovem, ela foi a primeira mulher a demonstrar amor maternal por mim. Eu tinha uma impressão totalmente errada das mulheres devido à forma como minha mãe abusou de mim e me rejeitou, mas Gwen era o oposto do que eu esperava. Ela era uma dama; graciosa, calorosa e receptiva. Uau! “Essas pessoas são de verdade”, pensei enquanto ela respondia à nossa inquietação com calorosa aceitação, olhos confiantes e um sorriso carinhoso.

Naquela noite, Dave planejava visitar um membro de sua congregação. Ele se virou para Gwen e perguntou: “Por que você não vem comigo? Nicky e Israel podem ficar com as crianças.” Por um momento, os olhos de Gwen lhe traíram com sua surpresa em relação à sugestão de que dois jovens que até poucos dias antes estava liderando gangues em Nova York — que mal tinham saído das ruas e estavam há pouco tempo fora de uma vida de derramamento de sangue e crimes — deveriam cuidar das suas duas preciosas filhas pequenas e do seu filho recém-nascido. Mas ela se recuperou rapidamente e nos deu breves instruções sobre os cuidados e a alimentação das três crianças.

A verdade é que ninguém ficou mais chocado do que eu e Israel com a ideia de sermos confiados com a responsabilidade de cuidar dessas crianças. O resultado dessa confiança sem precedentes foi que esses bebês estavam mais seguros conosco do que estariam com qualquer outra pessoa porque, literalmente, nós os teríamos protegido com nossas vidas. Enquanto Gwen nos abraçava e saía pela porta, eu já a amava mais do que jamais amei alguém. De fato, meu amor e respeito por ela moldaram e influenciaram meu futuro relacionamento com minha esposa, Gloria, e nossas quatro filhas.

Esse vislumbre da vida da Gwen no início do ministério de Dave com os membros das gangues da cidade de Nova York revelou o que se tornaria o contínuo papel dela no ministério dele. Ela enfrentou muitos desafios, surpresas, decepções e situações avassaladoras à medida que o ministério de Dave se desenrolava e se expandia. Não tinha como ela ter sido preparada com as suas próprias forças. Apenas Deus sabia o que se aproximava dela. Mas, assim como ela enfrentou o desafio de ter a sua casa “invadida” por nós, garotos de rua da cidade de Nova York, ela enfrentou esses desafios através da força divina. Durante a nossa semana na Pensilvânia, Israel e eu observamos a vida serena e pacífica de Gwen; uma unidade familiar amorosa, uma parceria. O que nós não vimos foi o futuro dela, repleto de doenças, dor incompreensível e angústia emocional. Mas essa é a história da Gwen, a qual ela nos conta com grande honestidade e humildade neste livro.

Gwen tem sido fiel ao seu Senhor Jesus, a seu marido, a seus filhos, a seus amigos e àqueles que ela e Dave conheceram através dos ministérios do Desafio Jovem, da World Challenge e da Time Square Church. Uma das características mais fortes de Gwen é que ela não demostra às pessoas a sua dor. Ela é uma mulher de dignidade, que aprendeu a levar a sua vida privada ao Senhor. Mas, através da sua própria dor, Deus lhe deu uma compaixão abrangente que a compele a se estender aos outros que estão sofrendo.

Eu acredito que, ao lado de Deus, Gwen é a maior força na vida de David Wilkerson. Ela esteve ao seu lado nos bons e nos maus momentos, na pobreza e na fartura. Acredito que Deus preservou a sua vida e continua a lhe dar forças porque Dave precisa dela.

Minha esposa, Gloria, e eu temos a honra de prestar homenagem a uma de nossas heroínas — uma campeã cuja vida é um exemplo da graça de Deus em tempos de adversidade. Ela bebeu profundamente do rio do conforto que o Espírito Santo proporciona, e permitiu que ele fluísse através dela para os outros. Ela provou que o nosso Deus “nos consola em toda a nossa tribulação, para que também possamos consolar os que estiverem em alguma tribulação, com a consolação com que nós mesmos somos consolados por Deus” (2 Coríntios 1:4).


Nicky Cruz